Faixa a faixa – Yannick Hara é “O Caçador de Androides”

Por: Vinícius Aliprandino

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2019. O que antes era o futuro, agora, é o presente. Tão presente e tão estranho, nada mais distante, nem mesmo a distopia. Inspirado pelo universo cyberpunk, com exclusividade para o filme Blade Runner (1982) e Blade Runner 2049, o músico Yannick Hara lançou um disco que coloca o passado, presente e futuro, tudo dentro de um mesmo universo atual e caótico.

O Caçador de Androides” conta com 12 faixas, uma diversidade de influências musicais e mais um time de participações especiais.

Na sonoridade Yannick apresenta o rap dos anos 1990, o dubstep, o big beat, o pós punk, o punk, o synth pop e o trap. Todos entrosados, dançando entre si e agindo juntos na melhor forma de expressão da arte. Aquela que faz a denúncia, busca por libertação e canta contra os preconceitos.

Para se juntar ao rapper nessa caça aos androides, Rodrigo Lima (Dead Fish), Clemente Nascimento (Inocentes/Plebe Rude), Moah (Lumiére), Rike (NDK), Keops & Raony (Medulla), o rapper paraense Cronixta, o poeta Rafael Carnevalli e a cantora Sara Não Tem Nome se jogaram de cabeça no trabalho.

Apesar do disco ser lançado em novembro de 2019, ano em que se passa o filme Blade Runner, a saga de Yannick começou em maio. A partir de então, o artista vem lançando gradativamente seu disco recheado de uma realidade assustadora, mas nada diferente do que estamos acostumados. O que deixa tudo ainda mais assustador, pois a sociedade vive uma época de tensão, violência, culto a tecnologia, falta de empatia, ego inflado e muito mais.

A ideia por trás do disco pega justamente nessa ferida, porém como sinal de alerta. Um alerta vermelho que pisca e soa o alarme desesperadamente para que a população desperte deste transe.

 

Yannick

 

Linha do tempo

Em maio, Yannick dava o pontapé inicial nos lançamento do disco, com o single “Blade Runner”, que além de ser lançado em todas as plataformas digitais, também ganhou clipe.

No mês seguinte, era a vez de “A Ideal Mão de Obra Escrava” tomar o Spotify e o Youtube.

Em julho, Yannick leva ao público o single “Androides Sonham Com Ovelhas Elétricas?”. Agosto chega e com ele o single “Voight Kampff” é lançado. Em setembro, o single “Caótico Distópico” surge rasgando os ares com caos e distopia sendo denunciados e vivenciados.

Em outubro, “Lágrimas na Chuva”, é lançado e promove ainda mais o disco, no mês que antecedia seu lançamento.

 


 

Faixa a faixa

 

“Blade Runner”

Quebrando paradigmas, denunciando os androides reais, as réplicas e as cópias que pensam ser humanos, mas não tem vida. Assim é a faixa que abre o disco. “Blade Runner” surge pedindo mais vida, mais liberdade e uma desconexão do culto a tecnologia, onde todos vivem conectados em seus smartphones, como se fossem apenas uma extensão deste.

O poeta Rafael Carnevalli faz sua parte no final da faixa, com sua mensagem que fazendo par com a crítica ao culto da tecnologia, brinca com as palavras, em um jogo sobre a realidade de uma sociedade que se deixa levar ao controle de dispositivos eletrônicos, sem ao menos se questionar.

 

 

 

O Prólogo e o Título

A segunda canção do disco é “O Prólogo e o Título”. O rap bate forte. Na participação especial, Clemente Nascimento, das bandas Inocentes e Plebe Rude canta junto de Yannick em uma canção que fala sobre Deus, colonização, escravidão, punição e muito mais.

 

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Foto por Natali Arruda

 

Androides Sonham Com Ovelhas Elétricas?

Androides Sonham Com Ovelhas Elétricas?” é a questão. Não questionada apenas por Yannick. Ao seu lado, Moah (Lumiére), Rike (NDK), Keops e Raony (Medulla) se unem para também perguntar e ao mesmo tempo responder, mostrando que os androides são servos de um governo fascista e, manipulam as mentes humanas para que essas estejam adaptadas as métricas sociais impostas e aceitas pelo sistema higienista.

 

Voight Kampff

A quarta canção do disco é “Voight Kampff”. A faixa fala sobre a maldade e a perversidade do mundo. O título da música é uma referência a um teste científico e psicológico fictício citado no livro de ficção científica “Do Androids Dream of Electric Sheep? (“Andróides Sonham Com Ovelhas Elétricas?”), de Philip K. Dick, e encenado no filme Blade Runner (1982).

Durante o filme, o interrogador faz séries de perguntas e o entrevistado responde. A intenção do teste é para saber se o entrevistado é ou não um replicante. Na história de Blade Runner, replicantes são seres humanos artificiais que em determinado momento da história, são banidos da Terra e utilizados como mão de obra para serviços perigosos e nocivos, sendo criados apenas para servir.

 

“Eu Quero Mais Vida Pai”

Com a participação da cantora Sara Não Tem Nome, “Eu Quero Mais Vida Pai” se mostra como a canção mais calma do disco. Porém, é apenas o ritmo. As vozes de Yannick e Sara apresentam uma canção desesperadora sobre um replicante que busca voltar para casa e, em determinado momento, se revolta com seu criador.

O título da canção é repetido várias vezes de modo a fixar na cabeça, mostrando a melancolia de quem foi criado a imagem e semelhança de um ser, dito superior, porém preso em um mundo carregado de problemas e restrições.

 

foto por Tiago Santana
Foto por Tiago Santana

 

Lágrimas na Chuva”.

Vencer o ego. Lutar contra si mesmo na frente do espelho em busca de se tornar alguém melhor, Longe dos moldes que a sociedade impõe e faz aflorar o egoísmo de cada um. Yannick e Rodrigo Lima (Dead Fish) dividem as vozes em uma das canções que se percebe a maior luta do disco. Aquela que e trava consigo mesmo.

As expressões mais profundas das avalanches da alma”, “Acorde é hora de morrer”, “A morte do eu, ao me confrontar eu me contrário, ao me remontar eu me purifico” – cada um dos versos mostram a luta por se tornar alguém mais puro, com empatia, deixando a lágrima cair na chuva da tempestade, que limpa e leva embora toda a sujeira interna que entope cada ponto do corpo com mesquinharias.

 

Replicantes

Simbolizando várias cópias, réplicas cada vez mais sem sentido e, cada vez, mais iguais, a faixa “Replicantes” segue por toda sua extensão repetindo as palavras cópia da cópia da cópia da réplica e réplica da réplica da réplica da cópia.

 

“Sapper Morton”

O ponto maus furioso e rápido do disco está aqui. “Sapper Morton” é um punk rock rápido e traz sua mensagem crua e direta sobre um replicante que entende sua realidade e busca destruir o sistema.

A crítica bate forte contra polícia, que seriam os novos replicantes que aparecem para limpar a “sujeira” citada na canção. O personagem Sapper Morton é um rebelde que luta contra toda a ordem estabelecida e ao longo da canção se mostra resistente.

“Mais humanos do que os humanos. Perfeitos. Tão puros. Nunca Traem… Se ferir minha existência, eu serei a resistência”

As frases colocadas mostram claramente uma crítica a ideia do cidadão de bem. Expressão tão comum na atualidade, que diz respeito áquela pessoa que se diz seguidor da lei, da religião e em defesa do que julga por família tradicional, porém carregado de preconceitos e que, muitas vezes, se utiliza de meios para burlar as próprias leis que defende, a seu favor. Em contraste, Sapper Morton, apesar de ser um rebelde replicante e marginalizado, é mais humano do que um cidadão de bem.

 

“A Ideal Mão de Obra Escrava”

Outra das faixas furiosas do disco, “A Ideal Mão de Obra Escrava” bate na tecla das reformas previdenciárias, trabalhistas e tributárias, que são feitas para beneficiar á elite, enquanto cria, ao mesmo tempo, uma mão de obra cada vez mais desvalorizada.

A música ainda tem muito fôlego para fazer a crítica ao setor do agronegócio, as doenças causadas pelos agrotóxicos e a devastação causada pelas plantações de soja, criadas para alimentar o gado da indústria da exploração animal.

 

 

 

“Eu Sei O Que é Real”

A canção carregada de efeitos se mostra como a mais futurista do disco. As batidas são frenéticas e o refrão gruda na cabeça de maneira tão sinistra quanto a realidade os pensamentos de aniquilação citados na música. “Eu Sei O Que é Real” é um apelo para escolhas mais humanas e que estejam de acordo com as ideias de amor ao próximo.

 

“Caótico Distópico”

Duas partes. Do rap ao pós punk. Do caos a distopia. Dois movimentos musicais pautados na crítica social e que foram bem utilizados por Yannick. “Caótico Distópico” em sua primeira parte fala sobre alguém que vê sua vida em função do capitalismo, se tornar cada vez mais apática.

Sufocado, o personagem se rebela e rompe com suas amarras na segunda parte da faixa. Distópico é o presente, mas também é o momento de sair do estado de inércia que a sociedade se encontra.

A música é o maior alerta do disco, batendo de frente com as mortes da população pobre nas periferias, consideradas como marginais e excluídas socialmente, de conseguir ter uma vida digna.

“”A cada criança que nasce, mais um número inválido, Edgar visionário: O futuro é uma criança com medo de nós””

O trecho mostra a preocupação de Yannick em relação ao cenário político atual, que utiliza de violência policial, preconceito e favorecimento às elites, enquanto que temas como educação, inclusão social, combate a racismo, homofobia, machismo, xenofobia, entre outras questões são vistas como gastos ao invés de investimento e bem estar da população.

 

Caótico Distópico

 

“O Artificial”

Ao lado de Cronixta, Yannick encerra o disco com mensagem de vandalismo virtual, a fim de quebrar tudo que é artificial e romper com as desconexões de afetos que as tecnologias impõem a vida. Temas como corrupção e opressão também são parte da canção. A faixa defende a ideia de que a classe política suja e que apoia a violência é um reflexo da sociedade.

“A esmo estamos e estamos a esmo. Vandalismo virtual. Destrua a corporação”

 


 

Confiram “O Caçador de Androides” no link abaixo e acompanhem o trabalho de Yannick Hara, através da página oficial do músico no Facebook e do perfil no Instagram.

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